Estou num boteco jogando sinuca e tomando minha cerveja, nada mais usual. Dois amigos meus resolvem ir fumar um baseado em algum lugar do bairro, eu não me importo, tudo o que eu quero é ganhar a partida. Estou jogando contra um estudante de música da USP, que eu havia visto apenas uma vez na vida, naquele mesmo bar, e contra outro cara perdido no fim da tarde paulistana.
Todos na mesa jogam razoavelmente bem, mas uma onda de azar faz com que todos nós errássemos a mesma bola, até que a sorte decidiu fazer justiça e então o primeiro que havia errado, marcou. Fim de jogo. Encaro a derrota, e iniciamos uma nova partida.
Tranqüilamente eu passo o giz em meu taco, e quando eu resolvo dar uma olhada no movimento da rua, percebo duas viaturas da polícia e dois meliantes sendo enquadrados. Mais uma cerveja, e uma espremida de olhos.
– Porra, são meus amigos. – digo para aqueles que estão no bar. – Rodaram.
Não faço a menor idéia do que fazer, e então resolvo continuar a partida, afinal é inaceitável perder duas vezes seguidas.
Passam-se meia hora, vou ao banheiro, e quando eu volto, meus dois camaradas estão de volta ao bar. Perplexo, pergunto o que aconteceu.
– Os PMs me extorquiram, cara. Levaram quarenta pratas. – disse.
Não liguei, comigo já aconteceu pior e continuei a escutar o que eles tinham a dizer.
– Cara, denunciaram a gente de algum lugar por aqui. Acharam que eu e o outro chapa estávamos trepando!!!
– Então por que não aceitaram a denúncia e fingiram que eram gays?! Melhor estar fodendo do que estar chapado.
– Sei lá, o cara já chegou me apontando uma 38, apaguei a ponta e só esperei pra ver o que acontecia.
– Idiota.
A partir desse momento já passamos a desconfiar de todos no bar, apesar de muitos deles terem vindo nos dar conselhos. É muito estranho quando de uma hora para outra, todos com quem você estava socializando passam a ser suspeitos.
Por um breve momento me senti em Reservoir Dogs, e até imaginamos quem era o cagueta filho da puta. Decidimos cair fora de lá o mais rápido possível, e quando estávamos indo para o carro, temos uma grata surpresa: uma viatura estava fazendo blitz a menos de 20 metros do nosso carro. Obviamente tinham visto que os caras voltaram para o bar, logo teriam mais dinheiro para extorquir, afinal a rua era medíocre, nenhuma viatura estaria lá em circunstâncias normais.
Resolvi voltar para casa a pé, ainda puto com o fato de terem extorquido meus camaradas por nada, já que um baseado não dá cadeia, e nem porra nenhuma.
Acho engraçado como alguém, só por usar uma farda, se sente melhor que os outros ao seu redor, sendo que na verdade, ele não passa de um peão do Estado, que apenas segue cegamente às suas ordens. A proibição da maconha continua, a meu ver, sendo algo extremamente abusivo, mas isso é assunto suficiente para um documentário inteiro.
Vou comer pizza e me virar com o dinheiro que me sobrou, já que com todos roubados, eu tive que arcar com a conta do bar.